Quando você pensa em futebol geralmente pensa somente num esporte que traz alegria para muitas pessoas, não é mesmo? Pois, saiba que infelizmente o futebol pode ser também o criado de vários conflitos sociais. No texto a seguir buscamos identificar e interpretar algumas das principais características sociais que o futebol possui em nosso país.
Ascensão Social
Uma das primeiras características que se destacam desse esporte na sociedade é o fato de que os clubes de futebol (nos países em que houve sua maior difusão) passaram a oferecer melhores condições materiais para que os esportistas pudessem se dedicar somente ao esporte.
No início somente jogavam futebol praticantes que faziam parte da elite, ou seja, que tinham dinheiro e não precisavam trabalhar além de operários que jogavam pelo time da empresa e que por ela tinham a segurança de poder treinar e receber um salário. Depois de algum tempo surgiram os campeonatos e com eles outra instituição, os clubes.
Os jogadores de futebol dos clubes eram em grande maioria populares que tinham talento para o esporte e que tinham poucas possibilidades de ascender socialmente através de outro trabalho. Essa nova lógica do mercado fez com que surgissem diversos conflitos em que se discutia o profissionalismo e o amadorismo no esporte.
Conflito Racial
Um dos primeiros efeitos sociais que os clubes de futebol tiveram na sociedade foi o estigma da cor da pele. Durante as décadas de 1920 e 1930 houve um movimento conhecido como amadorismo marrom ou profissionalismo disfarçado. Clubes de grande destaque como o Vasco da Gama passaram a recrutar jogadores das classes populares para defender a sua camisa.
Alguns jogadores negros chegavam até mesmo a passar pó de arroz no rosto para deixá-lo mais claro para que não fossem alvo de preconceito. Porém, é claro que com o suor da partida logo o pó desaparecia e o jogador era identificado pela sua cor. Demorou bastante tempo para que se houvesse uma aceitação maior de jogadores de classes populares nos grandes clubes.
Copas do Mundo e Profissionalização
O grande movimento de profissionalização do futebol teve início com a primeira Copa do Mundo realizada em 1930. O fato de a competição de 1930 ter sido realizada no Uruguai tem grande influência a respeito da difusão do esporte na América Latina. Aliás, devemos destacar ainda que o fato de a Itália, na copa de 1934, ter recrutado jogadores de origem italiana em países como Uruguai, Argentina e Brasil deu início ao processo de transferências de atletas, isso deu gás para a profissionalização dos atletas.
Foi somente na Copa de 1938, realizada na França, que o Brasil finalmente conseguiu contornar os conflitos regionalistas que aconteciam entre Rio e São Paulo e então levar uma seleção forte para a competição. A seleção brasileira contava com vários jogadores negros ou mestiços que contribuíram e muito com um novo estilo corporal de jogar futebol.
De País Vira-Lata a País Ufanista
O futebol tem um impacto muito relevante na sociedade brasileira uma vez que a melhora de desempenho da seleção nacional na Copa do Mundo ajuda a desmistificar a ideia de que um país advindo de séculos de escravidão e domínio europeu e cuja população não tem uma unidade já que é mestiça de vários povos pode obter sucesso suplantando outros países como os da Europa.
Nesse contexto podemos destacar a Copa do Mundo de 1950 que foi muito importante para que se criasse uma identidade nacional com base na seleção, o futebol passa a ser a cara do Brasil. Um dos motivos que fizeram o Brasil construir a sua identidade sobre o futebol foi que logo depois da guerra ele foi o país escolhido para sediar a competição uma vez que a Europa não tinha estrutura para isso naquele momento.
Porém, o sentimento de país vira-lata voltou forte quando na final da competição a seleção brasileira perdeu a Copa. Em contraponto com o insucesso de vencer a competição o Brasil teve um grande êxito que foi construir o maior estádio do mundo com uma arquitetura que permitia uma grande multidão e que ainda possuía preços de ingressos populares.
Autodepreciação
O Brasil é um país que ainda está ‘erguendo’ a cabeça diante dos demais e provando que tem o seu valor. Contudo, não se pode negar que ainda somos um país que pratica a autodepreciação, ou seja, que está sempre se nivelando por baixo. Na época da Copa de 1950 isso foi observado quando se questionou se a derrota em campo não simbolizaria a derrota do povo que não poderia vencer e mais recentemente, na Copa de 2014, em que o país foi ‘humilhado’ pela goleada de 7×1 praticada pela seleção da Alemanha.
Mérito
A escolha dos jogadores pelo seu mérito, sem observar a cor da sua pele, garantiu um bom desempenho na Copa de 1938, mas foi visto como o problema nas Copas de 1950 e 1954 já que para muitos os jogadores das classes populares seriam fadados ao fracasso. No ano de 1958 veio a resposta para essa questão quando a seleção brasileira, ainda escolhida por mérito, venceu a competição provando que esses jogadores tinham plenas condições de ascender na vida assim como o povo.
Abaixo aos Estigmas
O sucesso na Copa de 1958 na Suécia ajudou o Brasil a superar alguns estigmas sociais como a cor da pele, por exemplo, haja vista que um dos jogadores de maior destaque, Pelé, é negro. Outro destaque foi Garrincha que mesmo tendo tido uma vida repleta de dificuldades se permitiu jogar de maneira alegre e irreverente. Os dois jogadores que tinham tudo para não crescer na vida mostraram para o país que era possível o povo das classes mais populares virar o jogo.
Sentimento Nacional
Quando a seleção brasileira ganhou os seus títulos em 1958, 1962, 1970 houve um sentimento nacionalista de que o futebol era a identidade dessa nação. O futebol era a válvula de escape através da qual o povo podia chegar ao sucesso. Hoje em dia a situação mudou drasticamente uma vez que os jogadores brasileiros de sucesso passaram a atuar no exterior reunindo lá fora um patrimônio que não conseguiriam se permanecessem aqui, se criou uma relação absolutamente comercial com o esporte.